terça-feira, 20 de maio de 2008

O Azedo Aroma da Fé

Belém, Círio de Nazaré, 2006

Costumo considerar meus conhecimentos de química, adquiridos no laboratório fotográfico, suficientes para explicar meu humor em relação aos aromas. Perfume doce, por exemplo, me provoca enxaquecas suficientes para acabar com uma reunião ou descer de um elevador antes do destino previsto. Em português claro, estou sempre a procurar a origem dos aromas que movem meu humor. Mas desta vez só posso “chutar”, pois não encontrei explicação no meu universo químico para o cheiro de Belém do Pará durante o Círio de Nazaré - maior festa religiosa das Américas... (será? Prometo procurar dados assim que me conectar à web para googlear) - Sei que a cidade é tomada por um mix de aromas, com forte destaque aos de urina com tucupi, sim queridos! Urina com tucupi.

Mas não vim até este .doc para falar mal de Belém, aliás, não estou falando mal, adoro Belém!

A festa do Círio é mais um destes movimentos do Brasil continental. Milhares de seres aglomerados num movimento de froterismo (procurem em seus dicionários ou vejam o rodapé *) que só os trópicos explicam. Fulano encoxa cicrano que encoxa mengano e por aí vai, tudo isto movido pela fé a Nossa Senhora, aliás somos ou não somos o maior país católico do mundo?

O estranho não é nada disto e sim que eu estava lá, pasmem, claustrofobias e outras manias não me impediram de suar a camisa junto a milhares, dois milhões de romeiros suados também, carregando minha parafernália-pré-diluviana-fotográfica, várias hasselblads e um tripé. Só louco carrega um tripé junto a milhares de qualquer espécie. Ainda não editei as fotos, mas espero gerundianamente ter obtido boas fotografias. Só sei que o cheiro ainda não desgrudou de mim. Viva o tucupi, já a urina...

*Froterismo - Obtenção de prazer sexual através do contato físico com o corpo de outra pessoa. Qualquer pessoa deve ficar excitada com algum tipo de contato, mas o froterista procura estas situações em meio a multidões, em espetáculos, ou em transportes coletivos lotados.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

SIRVA-SE VOCÊ MESMO, AFINAL DE CONTAS O PLANETA É SEU!

Em Blind City, fotografia de Ricardo van Steen que integra esta mostra, as paredes dos edifícios revelam uma cidade que ficou cega. Ela não mais nos olha porque não olhamos para ela. E não é que essa cidade é uma das formas de representação de nossa passagem pelo planeta!

O desafio de organizar uma exposição coletiva sobre meio ambiente é grande. O conceito ainda é difuso aos meus olhos. Sempre acho que meio ambiente é tudo. Por isso, Self Service é uma exposição que, sem se pretender premonitória nem planfetária do caos, apresenta um cardápio de imagens para seu deleite. Em tese, porque reside na fotografia essa mescla entre ciência e arte, física e química, alquimia e registro, fato e feito, e, melhor instrumento para esses dias de incerteza sobre calotas polares, não há.

Estamos acostumados, no mundo contemporâneo, a utilizar a imagem para vender, comprar, provar, ilustrar, emocionar, datar. Para minha surpresa, ela também é um instrumento de escolha. Self Service é isso: eco ou ego, mata ou mato, muito ou pouco, natureza ou progresso.
No mar de imagens de SambaPhoto, Ana Luisa e eu vasculhamos palavras-chaves que de certa forma servissem como guia para esta montagem: carne, fogo, mata, homem, árvore, água, e uma dezena de “tags”, que se transformam pelas mãos dos fotógrafos em outras chaves: emoção, denúncia, admiração, curiosidade. Ao final, mais que uma coletiva, um coletivo preocupado com nosso futuro.

Texto de apresentação da Exposição Self Service, Leo Burnett, maio de 2008.
Iatã Cannabrava

Blind City de Ricardo Van Steen
Porto de Valparaiso, Chile, abril de 2008


Sobre o volume das coisas (alto!) e o mau gosto!
Crônica de coisas cronicamente irreparáveis.


Muito se fala sobre o mau gosto de certas manifestações artísticas contemporâneas, além da diversidades de ataques aos modismos considerados bregas: música, arquitetura, decoração de interiores, literatura de auto ajuda, etc. e tal. A nação não tem ainda uma opinião clara sobre o Funk carioca, por exemplo: enquanto muitos se entregam as cachorras outros odeiam mortalmente o que acusam de empobrecimento da musica brasileira - alias críticos irão me jogar no cadafalso por chamar o Funk Carioca de música e ainda brasileira.

Mas vou parar de embolação e vou direto a minha tese, corroborada por muitos. A questão é de puro volume: esclareço: ninguém teria nada contra o axé music se fosse tocado no interior do sistema auditivo do individuo, viva o ipod!; ninguém ousaria falar mal dos edifícios da Av. Luís Carlos Berrini em São Paulo ou da orla de Boa Viagem em Fortaleza se os horrendos monstrengos lá colocados fossem baixinhos, ou seja, tivessem baixo volume.

A campanha cidade limpa não teria sido necessária se não fosse a gritaria visual que tomava conta de da Cidade de São Paulo, e o Carnaval não atrairia tantos desafetos se em vez de trio elétrico 220 volts tivesse trio 110 volts., quero dizer não podem abaixar o volume?

Antes que eu seja confundido com um vizinho ou sindico chato vou esclarecer que não nasci desgostando de nada disso, apenas o volume está alto, o volume de carros é altíssimo, o volume de crimes, de pobreza, tantos volumes que temos de baixar, antes que nos mandem calar a boca irremediavelmente para sempre.

Psiu.

Iatã Cannabrava, fevereiro de 2008

Arroubos poéticos
Frenéticos

Pula ginete do comboio gastronômico
Janta e deleita-te
Corre que farpas não irão te deter
Sorve tudo

Ai de ti se fores pelo asfalto
Ai que dores futurastes
Não faças casas, habite-as
Presente-se no pretérito
Foda-se as regras e nas regras

São Paulo, 23 de 10 de 01


domingo, 18 de maio de 2008


Aquela sexta, foi e não voltou,
Voltaram outras, muitas.
Inclusive quintas, quartas, terças,
Até mesmo um domingo passou por entre eles,
Tinha gente, luzes, mas aquela sexta não passou mais.

São Paulo, 27 de agosto de 2004


quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

É proibido fotografar!


Qual o fotógrafo que nunca ouviu a frase: “não pode fotografar aqui”, que atire o primeiro click. São Paulo é a cidade do não pode fotografar por excelência. A frase sai da boca de seguranças, gerentes, diretores, do comércio, das residências, instituições públicas e privadas e até parques – sim, pasmem, eu disse parques!
Nas minhas andanças, coletei uma coleção de histórias que agora divido com os leitores. É verdade que eu sou meio briguento e meus relatos se avolumam um pouco demais da conta, mas mesmo assim, vale a crônica e a crítica. Ah, em tempo: proponho aos leitores, fotógrafos profissionais ou amantes do click que passem a adotar o adesivo “aqui pode fotografar a vontade”, e coloquem aonde forem bem recebidos.

Uma amiga (amiga até o dia que ela ler esta matéria) trabalhou durante anos na gerência de marketing de vários dos principais shoppings desta capital. Criativa e ousada, ela realizou campanhas memoráveis, e em várias oportunidades discutimos questões relativas à difusão da arte fotográfica nos espaços de shoppings centers. Um dia perguntei: Por quê é proibido fotografar no interior dos shoppings? … segundos de silêncio e… : “Porque abriríamos brechas para a espionagem entre lojistas, copiando-se vitrines e outras idéias”. Pasmem denovo, foi isto mesmo que ouvi, nós fotógrafos transformados em poderosos espiões. Alguns meses mais tarde, em outro encontro de trabalho, ela me mostrou orgulhosa as fotos que havia feito de um evento, dentro de um shopping de Miami, de onde pretendia buscar inspiração!!

Durante a realização do Foto São Paulo, em setembro de 2001, evento onde reunimos quase três mil fotógrafos entre amadores e profissionais, fomos atrás de autorizações nos lugares onde costumeiramente é proibido fotografar, entre eles o Metrô que simplesmente autorizou. Ou seja, se pedir pode, se for com a benção do chefe pode! Mas, ser for sem a autorização a foto é diferente? Nem no Metrô de Moscou na ainda União Soviética fui interpelado por seguranças por estar fotografando, mas aqui no Brasil não pode. Bom… o mais curioso mesmo foi o fato de que nas dependências da Sala São Paulo e do Memorial da América Latina, ambos espaços sobre a custódia da Secretaria de Estado da Cultura, patrocinador do evento, não se podia fotografar. Por quê? Nunca ninguém soube responder. Estava armado o bafafá: rádio pra cá, rádio pra lá, telefonemas… até que foi feita uma autorização especial para que os participantes pudessem fotografar.

Numa outra e divertida situação, eu estava fotografando uma senhora alemã, especialista em adaptar a vida de executivos alemães à cidade de São Paulo. Escolhi como fundo para os retratos, os edifícios do World Trade Center, na avenida Nações Unidas, marginal pinheiros. Mal comecei os cliques, veio o primeiro segurança com sua motinho, alertar que era proibido fotografar ali. Nos afastamos do prédio em direção à calçada e lá continuei meu trabalho, então o segurança voltou reafirmando a proibição. Eu aleguei que estava na rua, e que a constituição brasileira em nada alertava sobre fotógrafos na rua serem proibidos de mirar os prédios de sua cidade (acreditei que alegar a constituição seria método infalível). Que nada! O homem se enfureceu e começou aquela transferência de códigos e palavras soltas pelo rádio: ’Q.A.P.’ indivíduo no setor norte, fotografa torre sul, alerta às unidades”. Pronto! Em alguns minutos, estavamos diante de um pelotão de seguranças e gerentes de segurança. Novamente expliquei que estava apenas retratando a senhora – a alemã que nestas alturas do campeonato tinha virado minha defensora e de todos os fotógrafos. Aleguei inocência de todo tipo, mas não adiantou; eles se colocaram diante da câmera até que eu parasse meu trabalho. Quase chamei a polícia para me defender.

Sempre que me acontece algo semelhante, falo com outros fotógrafos para ouvir suas opiniões. A do Juan Esteves foi a melhor até agora: ele disse que quando ocorre algo similar, já vai tirando nomes de gerentes “falem com o dr. Dantas do marketing corporativo internacional que ele já está sabendo de tudo; rápido chamem o dr. Dantas!”, até descobrirem que não existe o dr. Dantas, já era! O clique em fuga já estava feito.

Acredito que é hora de discutirmos as questões relativas ao direito de imagem, não podemos esperar que as definições legais e culturais a respeito do que pode ou não sejam tomadas sem nossa participação.

O que será? Um resquício da ditadura, onde todos tinham algo a esconder ou será o medo? Será? Ou apenas uma moda que pegou e todos, sem saber porque, a imitam: é proibido fotografar e pronto! Está na hora de prestar atenção nestas questões. Se não, em breve estaremos proibidos de contar nossa própria história.

link sugerido por eduardo Muylaert http://www.strictlynophotography.com/

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Sobre saber muito e charlatões na era Google


Todos sabemos muito nos dias de hoje, somos sabidões da era internet. Como nos tempos da rádio relógio ou do Readers Diggest somos donos de informações inúteis aos borbotões. Nossos cronistas de hoje devem, em pânico, recorrer ao Google com medo de seus textos serem considerados plágios. Conversas de botequim são regadas a entradas no Google via Black Berry ou outro tipo de navegador portátil que, via Google, acabam caindo na nefasta Wikipédia, onde para tudo há um palpite embasado em milhares de internautas: de como nascem as borboletas ao temível aquecimento solar, as respostas estão lá. Charlatões podem ser desmascarados em segundos numa mesa de bar, mitômanos inveterados devem redobrar cuidados sob pena de passar um vexame automático, palpites sobre o glutamato monossódico, a reprodução da lula e o ponto de cozimento do polvo não mais irão impressionar gourmets, que num piscar de olhos poderão acessar via browser de bolso, sua página de dicas na internet: o Google! Esta é a verdadeira ditadura da verdade! No more charlatões! Do pântano enganoso das bocas para a galáxia asséptica dos programas de buscas! Viva a modernidade!